segunda-feira, 14 de maio de 2007

Dificuldade pessoal

Esta afirmação de Bento XVI na abertura da V Conferência Geral do Episcopado Latino Americano e do Caribe, parece-me quase consensual.
Conciliar isto com episódios como a recente excomunhão lançada sobre políticos mexicanos por causa da legislação aprovada a propósito do aborto, já é mais difícil.
Justificar a sanção no quadro do Direito Canónico é fácil. O difícil é fundamentá-la com o Evangelho. Mas pode ser uma limitação minha.

15 comentários:

Anawîm disse...

Caro Manuel,
Vou ter a ousadia de opinar acerca do que foi dito aqui.
Tenho pena que, talvez não tenhas lido, mais à frente, no mesmo documento do papa: "La Iglesia es abogada de la justicia y de los pobres, precisamente al no identificarse con los políticos ni con los intereses de partido. Sólo siendo independiente puede enseñar los grandes criterios y los valores inderogables, orientar las conciencias y ofrecer una opción de vida que va más allá del ámbito político."
É estranho tirar as frases dos seus próprios contextos sem mais.
E o papa não excomungou ninguém, pelo menos oficialmente... evidentemente que tinha que justificar e apoiar a opinião dos bispos mexicanos...

Este nosso papa herdou um legado "terrívelmente belo"... se tivesse sido o papa João PauloII a dizer exactamente as mesmas palavras, pensarias do mesmo modo?
Por mais que Bento faça ou desfaça, parece que faz sempre tudo mal...andamos a "persegui-lo" um bocado, e isso é triste, por serem justamente as pessoas que fazem parte desta igreja que mais o fazem...
Não há NINGUÉM que possa substituir João PauloII, não há dúvida. Mas, talvez, segundo os desígnios de Deus, não houvesse ninguém melhor que Bento, neste momento da História, para ser o sucessor de Pedro, deveríamos respeitar um pouco mais a vontade do Espírito Santo, não?

E porque não falar do esclarecimento do nosso papa acerca do limbo, que fez em Abril, segundo li algures: "No passado dia 19 de Abril, o agora Papa Bento XVI aprovou um documento de 41 páginas, preparado pela Comissão Teológica Internacional, que acaba com o limbo e abre as portas da salvação às crianças que morrem sem serem baptizadas."
É pena que destas coisas não se fale...

Caro Manuel, perdoa-me o extenso comentário, gosto de passar por aqui, de vez em quando... mas desta vez não poderia passar sem deixar esta longa palavrinha...

Abraço em Cristo

Anawîm disse...

mais uma vez peço desculpa...só agora vi que já falaste do limbo...
mesmo assim o tom da conversa...

Manuel disse...

Caro anawîm,

Antes de mais, bem-vindo. E obrigado por comentares.
Quanto ao que dizes, duas ou três notas:

1. Näo tirei nenhuma frase do contexto. Aliás, näo só li o texto, como tive o cuidado de linkar para a versäo integral para que todos possam ler tudo. Além disso, o resto do texto, a comecar pelo que citas, em nada diminui ou anula a frase que citei. Nem contradiz. Näo estou a ver a que possível "manipulacao" te podes referir.

2. Näo percebo bem a comparacao que fazes entre Joäo Paulo II e Bento XVI. E sim, se fosse Joäo Paulo II a protagonizar os acontecimentos, pensaria exactamente da mesma maneira. Este é um ponto fundamental para mim: o importante säo as ideias que se defendem e propöem. Nem as recebo acriticamente por virem do Papa (seja ele quem for), nem as valorizo mais ou menos por serem ditas por uma figura que me é mais ou menos simpática.
E por isso também discordo do que dizes em relacao a ninguém poder substituír Joäo Paulo II. Por que näo? Näo há ninguém insubstituível, a näo ser Jesus Cristo.

3. O que está em questäo no que afirmo, é que näo entendo como se pode defender a saudável separacao entre Igreja e Estado, a laicidade e, por outro lado lancar excomunhöes aos políticos cristäos (porque aos outros näo se pode...) por eles tomarem decisöes na esfera política. Repara que näo me refiro a proclamar as conviccöes e os princípios em que se acredita. Eu também sou contrário ao aborto e também disse e escrevi o que pensava na altura própria. Isso é parte da missäo da Igreja. Refiro-me a sancionar canonicamente as pessoas por elas assumirem posicoes distintas. Lamento, mas näo percebo.

4. Quanto ao Limbo, já disse o que pensava. Que se resume a pouco, como pudeste ler. Honestamente, o próprio conceito de Limbo sempre me pareceu uma bizantinice. Por isso, apenas me surpreendeu que fossem necessários tantos anos de estudos para concluír que näo existe...


Dito isto, importa sublinhar: é muito mais o que nos une, que aquilo que nos separa.

Abraco

Anawîm disse...

concordo contigo...realmente é muito mais o que nos une, que aquilo que nos separa.

fico contente que não faças distinção entre este papa com o anterior... reagi porque tenho visto muito isto, com muita pena minha, justamente no meio da Igreja
Mas também não posso defender totalmente o papa quando ele começa a falar de História... há sempre bronca, isso sim, foi um assunto grave, afirmar que a América Latina não foi evangelizada inicialmente com a espada... enfim...
O ser humano, de facto, não é perfeito, a Igreja é contituida por homens... e o que nos vale é o Espírito Santo, que Cristo "exalou" sobre nós, por vontade de Deus...

Agradeço o esclarecimento que fizeste

Anónimo disse...

"O difícil é fundamentá-la com o Evangelho".

Não, não me parece difícil. Ainda há uns dias li um comentário de Carlo Maria Martini num dos seus livros dissertando sobre a necessária tensão entre excomunhão e reconcialiação. Não fala de Jesus daqueles que pelo seu comportamento,
e depois de avisados, devam passar a ser tidos como gentios e publicanos?

Alfredo

Anónimo disse...

Saúde!

Mas, caro amigo, alguém se preocupa com estar excomungado?

Ou, sequer, se incomoda?

Ora, ora: ninguém liga a tal.

É assunto que não merece comentários.

Já quanto à arrogância e má-criação das palavras do bentinho sobre a evangelização das Américas, faço minhas as palavras do Cervantes sobre as gralhas: "Vós as vedes, vós as castigais".

Beijinhos,

ZR.

Jorge Oliveira disse...

Isso só prova o que andámos a dizer à tantos séculos que o papa é falível como outro Simão Pedro qualquer! Lol

Manuel disse...

Caro Alfredo,

Encontrará frases isoladas do Evangelho para justificar tudo e mais alguma coisa.
Outra coisa bem diferente é o "espírito" do Evangelho. Como sabe, esta é uma discussão antiga, também ela evangélica: uma coisa é a letra da lei, que se pode tornar um peso e uma prisão: outra é o espírito da lei. E o "espírito" que descubro no evangelho é o da liberdade, do amor e do respeito pelo outro. Até em relação aos inimigos...

Manuel disse...

OLá Zé!!

Há que tempos não te via! Como está Timor? Ou já regressaste?

Percebo o que dizes. E sei que assim é, de facto, para muita gente. Mas também sei que compreenderás que não é bem assim. Para muita gente que está na Igreja de boa fé, a excomunhão não é uma banalidade. Pelo contrário.
É certo que, se calhar, entre estes que foram excomungados, neste caso, muitos não se ralarão com isso. Mas aqui o que importa é o sinal dado pela Igreja. Não é só a excomunhão em relação a um grupo concreto. É a mensagem dada a todos os outros...

Volta mais vezes!

Abraço

Manuel disse...

Joincanto,

E pronto! Tinhas de ir parar à infalibilidade!! Isso é "deformação confessional"... :)
Prefiro nem entrar nesse campo...

Abraço

Vítor Mácula disse...

A mim o que me interpela nesta questão é a objectividade da aferição. Isto é, a comunhão, para ser entendida seriamente, tem de o ser do ponto de vista ontológico, e não administrativo : o que está em jogo é uma comunhão com a vontade de Deus, e esta existe ou não existe, seja ou não aferível. Nesse sentido, a conversão implica vontade de comunhão, e deveria incomodar todo o cristão. Passa-se é que a objectivação e redução da vontade de Deus a normas e preceitos não é de todo pacífica, nem no judaísmo nem no cristianismo, para nos ficarmos por aqui.

Abraço.

PS : Olá, Zé Ribeiro !

Anónimo disse...

Saúde!

Não, aqui estou ainda, são quatro da manhã e parto às onze.

Não consigo mesmo entender como um cristão - católico e tudo isso - se incomoda com a excomunhão! Que me interessa que uma mão-cheia de velhinhos, funcionando em circuito fechado, decrete que eu estou afastado da comunidade dos crentes? O problema é deles - não é meu! As minhas relações com Nossso Senhor continuam a ser iguaizinhas ao que eram ...

Quanto ao sinal dado a todos:

A Igreja, tal qual ela é hoje, e como quadro geral, não apresenta o rosto de Jesus: encobre-o. Nosso Senhor está sequestrado por uma trupe de reacionários, misóginos e homofóbicos, que Lhe atribuem a paternidade dos seus preconceitos. Que admira que muita gente decente do nosso tempo pense que não tem nada a ver com Ele? O afastamento das pessoas da Igreja institucional é para saudar e excomunhões destas reforçam esse afastamento.

O busílis está em conseguir que o afastamento da Instituição seja acompanhado da aproximação a Jesus Cristo. Ora, tais casos são muito mais abundantes que o que vocês julgam.

ZR.

Vítor Mácula disse...

Então, Zé Ribeiro... como sabes do que eu julgo... e quem são esses "vocês"?... A excomunhão é ontológica, pá... Como tu a dizeres que o "vocês" reacionários e etc, não comungam da verdade de Cristo, ou nas tuas palavras, encobre-Lhe o rosto... E o resto é entendimento jornaleiro, que confunde comunhão espiritual com comunhões ideológicas... ;)

E é curioso como está tanta gente convencida que tem uma aferição universal da vontade divina.

Anónimo disse...

Caro Manuel:

"Encontrará frases isoladas do Evangelho para justificar tudo e mais alguma coisa."

Não se trata neste caso de uma frase isolada, mas de todo um trecho que tem uma unidade
temática que permite que esteja destacado no leccionário e seja proclamado na missa perante o povo de Deus. Não pode ser descartado facilmente.

" Outra coisa bem diferente é o "espírito" do Evangelho. Como sabe, esta é uma discussão antiga, também ela evangélica: uma coisa é a letra da lei, que se pode tornar um peso e uma prisão: outra é o espírito da lei."

Por isso mesmo Jesus não prescreveou um código rigído, uma "sharia" que permitisse decisões impiedosas. Não detalhou em que circunstâncias devesse alguém ser tido por gentio ou publicano.
Este é mesmo um caso em que não há letra de lei, só "espírito".
Nesta situação, Jesus deu-nos
liberdade para usarmos com responsabilidade o nosso coração. Responsabilidade essa que obriga a que por vezes se diga quem não está na luz, mas nas trevas, confiando na assistência do Espírito Santo para nos ajudar a não cair na injustiça. Não se trata de excluir ninguém. Afinal Jesus também salvou os publicanos e os gentios. Trata-se de se ser claro e honesto. Seria honesto por exemplo ignorar a situação cismática em que entrou o Cardeal Lefébvre quando ordenou bispos por sua exclusiva iniciativa? Não seria uma grave irresponsabildade para com os fiés continuar a assobiar para o lado? E essa excomunhão taxativa, por decreto papal, foi afinal por uma questão de ritos e pouco mais (o que não é dizer pouco), enquanto que a excomunhão dos políticos mexicanos foi "latæ sententiae" (portanto sem necessidade de intervenção dos bispos) por uma questão bem mais grave. O único erro dos bispos mexicanos foi terem recordado o que deve ser óbvio para os envolvidos:
não é possível servir dois amos. Os bispos portugueses não precisaram de excomungar ninguém nos meses anteriores por causa do aborto, mas isso não quer dizer que muitos não tenham entrado em situação de excomunhão.

Recordar a alguém a sua situação de excomunhão não está em contradição com a falta de amor e respeito por esse alguém: pelo contrário, é amar esse alguém com pecado e tudo, como o Manuel uma vez disse, é ser honesto, verdadeiro, e é o primeiro passo para a
veradeira comunhão. Reconhecer que não estamos em casa, é o primeiro passo para lá entrarmos.

Alfredo

Anónimo disse...

...sequestrado por uma trupe de reacionários, misóginos e homofóbicos, que Lhe atribuem a paternidade dos seus preconceitos

(aplausos)



o bentinho tem um conceito mui sui generis de sana laicidad. tem tem.
e muita lata também : La Iglesia es abogada de la justicia y de los pobres, precisamente al no identificarse con los políticos ni con los intereses de partido. blá blá blá